Dos seres belos que o desejo anela,
não morre da beleza aquela rosa,
e a herdeira guarda imagem memorosa
se vier com o tempo a morte dela.
Mas tu, ao brilho dos teus olhos dado,
para essa luz a lenha que és consomes,
onde há abundância produzindo fomes
cruel para ti, contigo inimizado.
Tu que és do mundo enfeite de beleza,
e a primavera único anuncias,
doce sovina, esbanjas avareza
e em ti mesmo sepultas alegrias.
Mostra piedade ou sê o glutão do mundo,
com a tumba, engolindo-o sem fundo.
O tempo do ano vês em mim, coitado,
do amarelo das folhas que não duram
nos galhos gélidos em que penduram,
ruinas do coro de aves silenciado.
Talvez vejas o sol daquele dia,
depois de o ocaso ido no Ocidente,
que a noite escura leva, e nos dormentes,
como outra Morte, tudo silencia.
Em mim talvez o brilho desse arder
que em cinzas jaz da sua juventude,
leito de morte em que vai falecer
da mesma força que lhe deu saúde.
Isso vês tu, que ao teu amor dá ar,
para amar o que irás abandonar.
A chuva rugiu e foi-se. Agora
é limpa a noite de outono.
A água veste uma pátina dourada
e leva uma estrela brilhante de jade.
O rio Songhuajiang passa limpo e puro
com a delicadeza de sempre.
O pôr-do-sol enterra as montanhas em sombra.
Um espelho flutua no profundo vácuo verde.
A sua luz reflete o frio e húmido crepúsculo
enquanto brilha o orvalho
congelado nas flores.
(Du Fu)