O tempo do ano vês em mim, coitado,
do amarelo das folhas que não duram
nos galhos gélidos em que penduram,
ruinas do coro de aves silenciado.
Talvez vejas o sol daquele dia,
depois de o ocaso ido no Ocidente,
que a noite escura leva, e nos dormentes,
como outra Morte, tudo silencia.
Em mim talvez o brilho desse arder
que em cinzas jaz da sua juventude,
leito de morte em que vai falecer
da mesma força que lhe deu saúde.
Isso vês tu, que ao teu amor dá ar,
para amar o que irás abandonar.
A chuva rugiu e foi-se. Agora
é limpa a noite de outono.
A água veste uma pátina dourada
e leva uma estrela brilhante de jade.
O rio Songhuajiang passa limpo e puro
com a delicadeza de sempre.
O pôr-do-sol enterra as montanhas em sombra.
Um espelho flutua no profundo vácuo verde.
A sua luz reflete o frio e húmido crepúsculo
enquanto brilha o orvalho
congelado nas flores.
(Du Fu)
Este espaço
no mundo
é uma cantiga.
Esta cantiga
cresce no ritmo
das raízes.
Estas raízes
imitam formas
do coração.
Nada lhes peças.
Nada lhes dês.
Nada ofereças.
Tu
que és o espaço
a cantiga
as raízes
o coração
recolhe dignamente o que te deram,
e reverencia em ti a sua herança.
Agradece o que és porque te amas,
mas não te ames com os modos,
a intensidade dum adolescente apaixonado.
Antes abraça-te no teu abraço
com firmeza e rigor,
mas com cuidado,
como a amassar os músculos dum corpo velho.
Tu és os fios da memória antiga
a tecer-se nas mãos que se entrelaçam.
Não te enganes a pensar que é uma bandeira.
Que o coração
bombeie sangue
das raízes.
Que as raízes
marquem o ritmo
das cantigas.
Que essas cantigas
criem o espaço
do teu mundo.