Este quarto, que bem o conheço.
Agora alugam-no, e também o do lado,
para escritórios. A casa inteira tornou-se
um prédio de escritórios para representantes, homens de negócios, empresas.
Este quarto é-me tão familiar.
O sofá estava lá, ao pé da porta,
uma carpete turca à sua frente.
Pertinho, a estante com dois vasos amarelos.
À direita - não, ao contrário - um guardafatos com espelho.
No meio a mesa em que ele escrevia,
e as três grandes cadeiras de vime.
Ao lado da janela a cama
em que fizemos amor tantas vezes.
Ainda devem estar nalgum lugar, essas coisas velhas.
Ao lado da janela a cama;
à tarde o sol costumava iluminar a metade.
...Uma tarde às quatro em ponto separámo-nos
só por uma semana... E depois –
aquela semana já foi para sempre.
Queres atirar-me uma pedra?
Eis, toma o que resta do meu pêssego.
Vermelho-sangue, profundo:
só os céus sabem como é que amadureceu.
Meio quilo de polpa dalguém fez o trabalho.
Enrugado de segredos
e duro na intenção de conservá-los.
Porque surgiu, dum rebento de flor de prata,
dum copo de vinho superficialmente prateado com caule mínimo,
este glóbulo pesado que cai e rola?
Estou a pensar, é claro, no pêssego antes de eu comê-lo.
Porque tão de veludo, porque tão voluptuosamente pesado?
Porque tanta contundência a pendurar?
Porque tão espaçado?
Porque essa risca?
Porque essa adorável redondez bivalve?
Porque esse bico por baixo da esfera?
Porque a sugestão à mordida?
Porque é que o meu pêssego não é redondo e perfeito como uma bola de bilhar?
Assim seria se o ser humano o tivesse feito.
E no entanto, acabei de comê-lo.
Mas não era redondo e perfeito como uma bola de bilhar;
e, porque eu o digo, tu querias atirar-me qualquer coisa.
Eis, fica com a pevide do meu pêssego.
São Gervásio, a Toscana
Tempo depois da chuva, as Colinas da Feiticeira escurecem.
Agora elas destelham, cosidas com ouro e prata.
Erva verde bordeia o lago que escurece
e nuvens vermelhas fluem do este.
O dia inteiro, o papa-figos chama,
e os grous limpam no alto as brancas nuvens.
Uma vez secas, as flores selvagens inclinam-se
e, lá onde vento vassoura, caem.
(Du Fu)