Queres atirar-me uma pedra?
Eis, toma o que resta do meu pêssego.
Vermelho-sangue, profundo:
só os céus sabem como é que amadureceu.
Meio quilo de polpa dalguém fez o trabalho.
Enrugado de segredos
e duro na intenção de conservá-los.
Porque surgiu, dum rebento de flor de prata,
dum copo de vinho superficialmente prateado com caule mínimo,
este glóbulo pesado que cai e rola?
Estou a pensar, é claro, no pêssego antes de eu comê-lo.
Porque tão de veludo, porque tão voluptuosamente pesado?
Porque tanta contundência a pendurar?
Porque tão espaçado?
Porque essa risca?
Porque essa adorável redondez bivalve?
Porque esse bico por baixo da esfera?
Porque a sugestão à mordida?
Porque é que o meu pêssego não é redondo e perfeito como uma bola de bilhar?
Assim seria se o ser humano o tivesse feito.
E no entanto, acabei de comê-lo.
Mas não era redondo e perfeito como uma bola de bilhar;
e, porque eu o digo, tu querias atirar-me qualquer coisa.
Eis, fica com a pevide do meu pêssego.
São Gervásio, a Toscana
Tempo depois da chuva, as Colinas da Feiticeira escurecem.
Agora elas destelham, cosidas com ouro e prata.
Erva verde bordeia o lago que escurece
e nuvens vermelhas fluem do este.
O dia inteiro, o papa-figos chama,
e os grous limpam no alto as brancas nuvens.
Uma vez secas, as flores selvagens inclinam-se
e, lá onde vento vassoura, caem.
(Du Fu)
Costumava estar fascinado por como Ted Hughes retrata a beleza, misturada com a violência. Também me fascinava a facilidade para retratar a agressão, como impulso vital destrutivo para a sobrevivência. O Eros e o Tânatos. Acho que a fascinação nascia da minha incapacidade patológica para a agressividade.
Ontem publiquei neste blog o primeiro poema do primeiro livro de Hughes, em que narra como dá um tiro a uma magestosa águia. O seu primeiro poema será o meu último. Até aqui, Mr. Hughes. Obrigado por abrir-me os olhos ao contínuo vida-morte, mas há mais maneiras de vivê-lo, e tu és um puto animal.