Este espaço
no mundo
é uma cantiga.
Esta cantiga
cresce no ritmo
das raízes.
Estas raízes
imitam formas
do coração.
Nada lhes peças.
Nada lhes dês.
Nada ofereças.
Tu
que és o espaço
a cantiga
as raízes
o coração
recolhe dignamente o que te deram,
e reverencia em ti a sua herança.
Agradece o que és porque te amas,
mas não te ames com os modos,
a intensidade dum adolescente apaixonado.
Antes abraça-te no teu abraço
com firmeza e rigor,
mas com cuidado,
como a amassar os músculos dum corpo velho.
Tu és os fios da memória antiga
a tecer-se nas mãos que se entrelaçam.
Não te enganes a pensar que é uma bandeira.
Que o coração
bombeie sangue
das raízes.
Que as raízes
marquem o ritmo
das cantigas.
Que essas cantigas
criem o espaço
do teu mundo.
Costumava estar fascinado por como Ted Hughes retrata a beleza, misturada com a violência. Também me fascinava a facilidade para retratar a agressão, como impulso vital destrutivo para a sobrevivência. O Eros e o Tânatos. Acho que a fascinação nascia da minha incapacidade patológica para a agressividade.
Ontem publiquei neste blog o primeiro poema do primeiro livro de Hughes, em que narra como dá um tiro a uma magestosa águia. O seu primeiro poema será o meu último. Até aqui, Mr. Hughes. Obrigado por abrir-me os olhos ao contínuo vida-morte, mas há mais maneiras de vivê-lo, e tu és um puto animal.
Esses rebentos de ameixeira
costumavam flutuar no nosso saké.
Agora as flores
espalhadas, ignoradas,
jazem por todo o chão.
De vez em quando
também tu
deves ter saudades
do teu velho ninho
no fundo das montanhas.
Tradução do inglês a partir do trabalho de John Stevens. Dewdrops on a Lotus Leaf - Zen Poems of Ryôkan, Shambala, 1993, USA. O título é meu.
Foto de Nijwam Swargiary em Unsplash
(Ryôkan)